Recortes de Imprensa

Da Justiça do que é justo – Expresso – 02nov2023

Presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais crítica as mudanças “à pressa” no estatuto destes profissionais e recomenda ao Governo que ouça os conselhos superiores antes de avançar mais

No sucesso do sistema de saúde, os médicos, enfermeiros e outros técnicos desempenham papéis cruciais. São os guardiões da nossa saúde, trabalhando incansavelmente para cuidar de doentes, aliviar o sofrimento e salvar vidas. Sem esses profissionais dedicados, o sistema de saúde não funcionaria com eficácia.

Da mesma forma, nas escolas públicas, professores e auxiliares são os alicerces da educação. Moldam o futuro, transmitindo conhecimento e valores às gerações mais jovens. Sem esses educadores dedicados, o sistema educacional não cumpriria a sua missão de preparar os alunos para o futuro.

Na segurança pública, as forças policiais bem como os graduados são responsáveis por manter a ordem e a segurança nas nossas comunidades. Arriscam as vidas diariamente para proteger os cidadãos e fazer cumprir as leis. Sem esses profissionais dedicados, a segurança pública ficaria comprometida.

Mas e na Justiça? Será que as coisas são diferentes? A resposta é não.

Na Justiça, os funcionários judiciais desempenham um papel fundamental. São o alicerce do sistema judicial, garantindo que os processos judiciais sejam conduzidos com eficiência e precisão. Sem funcionários judiciais, a Justiça não pode funcionar adequadamente e acrescento: sem funcionários judiciais motivados e bem preparados.

Permitam-me contar uma história que ilustra esta importância. Imagine-se um tribunal onde um Juiz e um Procurador precisam de auxílio para a realização eficiente de certa diligência. Ambos têm argumentos válidos e o que estão a pedir nada mais é do que zelar para cumprirem escrupulosamente o mandato que a Constituição lhes confere.

Precisando de ajuda, voltam-se para um oficial de justiça, esperando que ele forneça os documentos e registos necessários. No entanto, descobrem que não há funcionários judiciais em número adequado para atender às necessidades específicas de cada magistratura. O tribunal está sobrecarregado, e os funcionários judiciais estão sobrecarregados. Situação que piorou por não haver já uma especialização/afetação de funcionários a cada uma das magistraturas. Situação que leva a atrasos nos processos judiciais, decisões equivocadas e, em última instância, à injustiça.

Assim como médicos, enfermeiros, professores, auxiliares e polícias em número suficiente e com carreiras definidas são essenciais para o funcionamento das suas áreas de ação, também os funcionários judiciais são vitais para o funcionamento eficaz do sistema judicial. Eles garantem que os tribunais operem sem problemas, mantendo registos precisos, organizando audiências e auxiliando juízes e procuradores. Pensar na Justiça e esquecer a importância dos funcionários judiciais é como pensar que apenas os médicos fazem funcionar os hospitais.

O estatuto específico para os oficiais de justiça tem de ser um passo crucial, podendo, e devendo, servir como uma ferramenta poderosa para melhorar a qualidade do serviço judiciário. Bastaria que o governo aceitasse proceder à integração do suplemento de recuperação processual nos salários dos oficiais de justiça, para que houvesse condições, e tempo para um trabalho sério e verdadeiramente reformista. Acresce, que tal integração não apenas reconhece o valor do trabalho dos oficiais de justiça, mas também melhora as condições de trabalho e a motivação.

É essencial que o Governo analise essa reivindicação de maneira construtiva, sem que haja pressa em implementar mudanças que poderão não ser as melhores. O que parece ser o caso em face dos pareceres já conhecidos. O Governo deve considerar a criação de um grupo de trabalho que envolva os Conselhos Superiores e as estruturas sindicais para elaborar um estatuto abrangente e bem planeado para os oficiais de justiça, processo colaborativo que permitiria a discussão de todos os aspetos do estatuto, incluindo não apenas as questões de financeiras, mas também outros elementos importantes, como a definição de funções, as condições de trabalho, as oportunidades de formação e desenvolvimento profissional, bem como as responsabilidades e deveres dos oficiais de justiça.

A Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça (CEPEJ) e a própria Comissão Europeia têm recomendado a melhoria do sistema judicial e a aceleração dos processos judiciais em toda a UE. A criação de um estatuto dos oficiais de justiça bem elaborado é fundamental, mas de forma transparente, inclusiva e baseada em evidências sólidas.

Já agora, sabem que um oficial de justiça pode ser obrigado a fazer mais de 80 horas mensais de trabalho suplementar, algum em período noturno? Ou seja, 880 horas de trabalho suplementar por ano, sem qualquer retribuição. Se Portugal não apostar nesta carreira, estará sempre a permitir a injustiça, no nosso caso, na casa onde ela é administrada.

in – https://expresso.pt/opiniao/2023-11-02-Da-Justica-do-que-e-justo-6a84b928

Falta de Investimento – Correio da Justiça – CMJornal – 1nov2023

A proposta de OE para 2024, anuncia a intenção do Governo em recrutar novos Oficiais de Justiça, mas sem avançar com qualquer previsão concreta. Infelizmente, já nos habituamos a que a execução orçamental fique sempre aquém das expetativas.

A justiça é o alicerce de qualquer sociedade que se pretende justa e equitativa. Contudo, a falta de investimento adequado tem gerado uma escassez crónica de recursos humanos neste campo vital. A falta de incentivos financeiros para atrair e manter talentos, bem como a sobrecarga de trabalho, tem resultado na deterioração das condições de trabalho.

Os funcionários judiciais, que desempenham um papel crucial na administração dos tribunais, muitas vezes são sub-remunerados e sobrecarregados, resultando em níveis alarmantes de rotatividade e insatisfação.

As consequências da falta de investimento na justiça são sentidas por todos os que a ela recorrem.

Para resolver esta crise, é necessário um investimento significativo na justiça. Isso implica atrair e reter talentos através de remunerações competitivas, melhorar as condições de trabalho e investir em formação contínua.

Reconhecer a importância de investir adequadamente nessa área vital é essencial para manter a integridade do sistema de justiça e a confiança do público.

 

Evitar erros – Correio da Justiça – CMJornal 25out2023

Os erros na justiça não são geralmente aceitáveis aos olhos da sociedade e, muitas vezes, tomam-se notícia de destaque nos meios de comunicação. Isso ocorre porque a justiça desempenha um papel fundamental na sociedade, garantindo a aplicação da lei e a proteção dos direitos dos cidadãos. Quando os erros ocorrem, isso pode minar a confiança das pessoas na imparcialidade e na eficácia da justiça. Os meios de comunicação têm o dever de informar o público sobre questões de interesse público, e os erros na justiça são frequentemente considerados como tal. É importante observar que, embora os erros na justiça sejam amplamente divulgados também é importante dar relevância aos problemas que atravessam os seus profissionais, informando e trazendo para o debate público as questões fundamentais que afetam, neste momento, os oficiais de justiça. Sendo uma carreira que carrega o sistema às costas, vê-se confrontada com uma diminuição drástica de trabalhadores nas secretarias dos tribunais, sendo-lhe exigido diariamente que “façam omeletes sem ovos”. Isso leva a um desgaste físico e psicológico que não é aceitável, contribuindo, assim, para maiores lapsos no cumprimento das suas funções.

Projeto de estatuto dos oficiais de justiça põe em causa autonomia do MP – RTP – 25out2023

O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) “opõe-se veementemente” à proposta de estatuto dos funcionários judiciais do Governo, acusando-a de colocar em causa a autonomia do Ministério Público (MP) e de violar o princípio de separação de poderes.

Num parecer do sindicato à proposta de revisão de estatutos, que incide sobretudo nas normas com repercussão na atividade do MP, o SMMP critica as normas constantes, que “constituem medidas de entorpecimento das funções do oficial de justiça, passando a tratar-se de meros agentes da função pública, totalmente dependentes de um serviço central da administração do Estado”.

“Os oficiais de justiça que exercem funções nas Secretarias do MP, em especial os que trabalham na área da investigação criminal, não podem estar sujeitos unicamente a ordens e instruções provindas de uma entidade administrativa. Tal decisão coloca em causa a própria autonomia do MP”, lê-se no parecer datado de 20 de outubro.

Um dos pontos analisados, a divisão da carreira de oficial de justiça em dois, criando uma categoria superior, merece críticas por não ir ao encontro da autonomização de carreiras reivindicada pelo SMMP — magistratura judicial e do MP — e por retroceder, no entendimento do sindicato, “ao tentar criar duas carreiras especiais, sem diferenciação entre funções necessariamente distintas das Secretarias Judiciais e das Secretarias do MP”.

“Este projeto ignora completamente as especificidades das funções exercidas pelo MP. Aliás, podemos ir mais longe dizendo que este projeto praticamente se esquece da existência do MP, bem como dos seus magistrados, das suas secretarias e dos oficiais de justiça que atualmente nelas exercem funções”, acusa o sindicato de procuradores, classificando o estatuto como um projeto “exclusivamente orientado para as funções da magistratura judicial e em que o MP é ignorado”.

O SMMP reitera que o MP necessita de um “corpo de funcionários próprio, autónomo, com formação adequada e especialização nas suas diversas áreas de intervenção”.

Sobre a possibilidade de os novos técnicos superiores de justiça virem a exercer funções de assessores de magistrados, o sindicato alerta para os riscos de violação do princípio de separação de poderes, sublinhando que “a carreira de oficial de justiça está subordinada ao poder executivo”, na dependência do Ministério da Justiça e da Direção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ).

“Os oficiais de justiça estão sujeitos ao dever de obediência, o qual consiste em acatar e cumprir as ordens dos legítimos superiores hierárquicos, que estão na dependência do poder executivo. A dependência funcional dos oficiais de justiça à DGAJ impede, por violação do princípio da separação de poderes constitucionalmente consagrado, a execução, com autonomia técnica, de trabalhos de elevada complexidade que lhe sejam cometidos por magistrado ou pela lei ou o exercício de funções de assessoria técnica aos magistrados”, defende o SMMP.

Recordando que as magistraturas defendem a existência de assessores aos juízes e procuradores, o sindicato defende que estes devem estar na dependência dos dois conselhos superiores — da Magistratura e do MP — “de forma a garantir as suas respetivas autonomia e independência”.

“A proposta apresentada constitui mais um ensaio velado por parte do poder político de tentar, por via da revisão da carreira dos oficiais de justiça, imiscuir-se no exercício da função jurisdicional e na atividade do MP e dessa forma dar mais um passo no processo de `administrativização` do sistema de justiça”, acusa o sindicato.

O parecer critica ainda o acesso a cargos de chefia por aprovação da DGAJ das comissões de serviço, sem que os critérios de seleção fiquem já especificados no estatuto, e que a renovação dessas comissões de serviço dependa também do diretor da DGAJ, “colocando os cargos de chefia à mercê de uma única pessoa, favorecendo ambientes propícios ao seguidismo e favorecimento dos `yes man`, em detrimento de se favorecer uma cultura de responsabilidade e qualidade das chefias”.

No início do mês, o MJ convocou os sindicatos para apresentar uma proposta de revisão dos estatutos profissionais dos funcionários judiciais e da sua carreira, com impacto estimado de 20 milhões de euros anuais, que transforma parte destes profissionais em assessores de magistrados, prevê a divisão da carreira em duas categorias, um suplemento mensal de 20% e um aumento de 100 euros no salário de ingresso na base da carreira, proposta que mereceu críticas dos dois sindicatos.

in – https://www.rtp.pt/noticias/pais/projeto-de-estatuto-dos-oficiais-de-justica-poe-em-causa-autonomia-do-mp_n1524173