É com grande perplexidade que assistimos ao final do mandato da Senhora Procuradora Geral da República, uma figura que, ao longo de seis anos, manteve um silêncio ensurdecedor sobre um dos problemas mais gritantes do sistema judicial – a falta de oficiais de justiça nos serviços do Ministério Público e nos tribunais. Este silêncio é mais que uma omissão; é uma negligência que custa caro ao funcionamento da justiça em Portugal.
Na sua primeira entrevista pública, ao invés de abordar a carência de recursos humanos e as condições extenuantes de trabalho dos oficiais de justiça, a Senhora Procuradora opta por utilizá-los como bodes expiatórios. Acusa-os de atrasar os primeiros interrogatórios dos arguidos da Madeira devido às suas greves, quando deveria estar ciente de que muitos destes profissionais, mesmo com o direito à greve, escolheram continuar a trabalhar sem receber qualquer compensação por horas extraordinárias. Estes são profissionais que, por devoção e sentido de dever, trabalharam sete, oito horas além do expediente, apenas para garantir que a justiça não parasse.
Essa deveria ser a real preocupação da Senhora Procuradora – reconhecer e valorizar o sacrifício daqueles que, apesar das condições adversas, continuam a carregar nos ombros o peso de um sistema que parece não os valorizar. No entanto, nunca se ouviu uma palavra de apreço ou preocupação da sua parte em relação à falta de recursos humanos que assola o setor judicial.
Ao contrário de outras personalidades ligadas à justiça, que se têm manifestado e reconhecido o esforço dos oficiais de justiça, a Senhora Procuradora permaneceu distante, alheia às dificuldades e desafios diários enfrentados por estes profissionais. A sua abordagem, na sua primeira e tardia entrevista, não só falha em reconhecer a realidade como também desfere um golpe injusto e desnecessário àqueles que mais têm sofrido com a sobrecarga de trabalho.
Neste contexto, não é apenas a justiça que está em julgamento, mas também a liderança de quem deveria ser a guardiã da sua eficácia e equidade. Se há algo que a Senhora Procuradora deveria levar deste mandato, é a lição de que a justiça não se faz apenas nos tribunais, mas também no reconhecimento e valorização de todos os que nela trabalham, muitas vezes, em condições de grande sacrifício pessoal.